Este mês, as Dras. Ana Mosca e Mariana Gusmão, do Departamento de Dermatopediatria da SBDRJ, trazem à nossa reflexão o tema sarampo. Segundo a Superintendência de Vigilância em Saúde da Prefeitura do Rio, a doença explodiu em número de casos este ano no município do Rio: 564 casos foram registrados de janeiro a junho, contra 104 casos registrados durante todo o ano de 2019.
Vamos à leitura:
Sarampo é uma infecção viral grave, altamente contagiosa, causada por vírus do gênero Morbillivirus, família Paramixoviridae. A transmissão é feita pelo ar, por contato com gotículas de saliva e secreções contaminadas. Transmissão indireta é praticamente nula. Acomete qualquer idade, mas crianças menores de 5 anos são o grupo mais vulnerável (60% dos casos), e a mortalidade é maior em menores de 1 ano. (1)
No Brasil, a vacinação foi introduzida na década de 1960 e se intensificou na década de 1980. Desde então, a doença comportava-se de forma endêmica, com epidemias a cada 2 ou 3 anos. Em 1992, o Brasil instituiu o Plano Nacional de Eliminação do Sarampo, com objetivo de erradicar a doença até o ano 2000. Porém, nos últimos anos, a taxa vacinal caiu para 85%. O Brasil acabou por perder o certificado de erradicação da doença fornecido em 2016 pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
A 1ª reincidência ocorreu em 2018 no estado de Roraima, em criança imigrada da Venezuela, e depois houve a circulação do vírus, também pelo estado do Amazonas. (1) (2) De fevereiro de 2018 a janeiro de 2019, foram registrados 10.274 casos de Sarampo no Brasil, sendo 9.778 apenas no estado do Amazonas e 19 no estado do Rio de Janeiro. Em 2019 foram 470 casos da doença no Rio de Janeiro. Só até março deste ano, o estado do Rio de Janeiro já registrou 276 casos, e apenas 1/3 da meta de vacinação foi atingida. Segundo a OMS, surtos de Sarampo continuam a se espalhar pelo mundo e os casos notificados no 1º semestre de 2019 são os mais elevados desde 2016. (3) (4)
A fase de incubação é de 10-14 dias, em geral assintomática. A maior contagiosidade ocorre no período prodrômico e inicial exantemático. A fase prodrômica dura de 2 a 8 dias, e manifesta-se por febre de intensidade moderada a alta, mal-estar e sintomas catarrais (coriza, lacrimejamento, irritação ocular, e tosse seca). Em alguns pacientes surge o sinal de Koplik na mucosa jugal (manchas brancas com halo eritematoso difuso). Dois dias após este sinal, os sintomas catarrais e a febre exacerbam-se e começa a fase exantemática, que pode durar de 3 a 5 dias. O exantema é morbiliforme, inicia-se à partir da face e é descendente, alcançando progressivamente o tronco e os membros. Observa-se rash máculo-papuloso, confluindo em placas, entremeado por áreas de pele sã. Quando atinge os membros, o exantema regride e deixa uma descamação fina, também de forma descendente. Nesta fase tardia, as lesões tornam-se hiperpigmentadas e ocorre queda da febre e redução dos sintomas catarrais. A tosse passa a ser produtiva e perdura um tempo maior. (5)
São descritas várias complicações, como pneumonia intersticial viral, laringite obstrutiva (por acúmulo de secreção), miocardite, diarreia, lesões oculares, estomatite, encefalomielite disseminada aguda e panencefalite esclerosante subaguda. Muito importantes são as complicações bacterianas como pneumonia, gastroenterite, otite média e ceratoconjuntivite (5). O tratamento é de suporte e antibioticoterapia, quando necessário. Embora não tenha um tratamento específico, o diagnóstico precoce é essencial para uma rápida recuperação e impedimento de evolução para estágios mais graves.
O SUS oferece a vacinação como forma de prevenção. A primeira dose deve ser feita aos 12 meses e faz parte da tríplice viral (Caxumba e Rubéola). A segunda dose deve ser feita aos 15 meses e faz parte da tetra viral (inclui varicela). No 1º ano de vida ocorre uma queda progressiva dos anticorpos maternos passados através da placenta e, geralmente a partir dos 9 meses de idade, grande parte dos lactentes é suscetível à doença. Sendo assim, em alguns estados, foi instituída a dose zero (dose extra) em crianças de 6 meses a 1 ano. Para quem tem entre 1 e 29 anos e recebeu apenas uma dose, recomenda-se tomar a 2ª dose. Adultos de 30 a 59 anos que não sabem se foram vacinados na infância, devem tomar apenas 1 dose. (3)
Bibliografia:
- Clinical, laboratorial diagnosis and prophylaxis of measles in Brazil. J. Bras. Patol. Med. Lab. Vol. 55 n. 4 Rio de Janeiro July/Aug. 2019 Epub Sep 02, 20129
- Informe Epidemiológico do SUS. A evolução do sarampo no brasil e a situação atual. Enf. Epidemiol. Sus v.6 n.1 Brasília mar. 1997
- Site do Ministério da Saúde (saúde.gov.br/saude-de-a-z/sarampo)
- Site da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro (saude.rj.gov.br/notícia/20202/03/sarampo)
- Doenças Infecciosas: conduta diagnóstica e terapêutica. Mauro Schechter, Denise Vantil Marangoni. Ed Guanabara Koogan, 2ª Edição, 1998